Panchito Velázquez, inigualável

 

‘’Onde não sou feliz, não jogo. Ninguém me obriga."



Polémico, azarado, surpreendente e genial. Alguns dos adjectivos que se podem aplicar à carreira daquele que foi o último grande ícone do Hóquei em Patins. Compensou a sua rebeldia e irreverência com o talento, enchendo praticamente todos os pavilhões por onde passava. Não foi idolatrado por todos porque desafiou as leis da mentalidade desportiva, sendo um dos poucos que até hoje conseguiu contrariar a frase ‘’o único sítio onde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário’’. Com Panchito esta frase deixou de fazer sentido para muitos, criando quer nos jovens jogadores quer nos adeptos a sensação de que com ele em pista tudo era possível de acontecer pois tudo era genuíno, criado como por magia, por diversão, como um conto da Disney. Panchito não é regra, é excepção.

‘’Eu divirto-me sempre quando jogo hóquei. Para mim funciona assim, não o consigo entender de outra maneira. Gosto que as pessoas que me vêm ver fiquem contentes pelo que faço dentro de rinque’’.

Primórdios
Nascido em San Juan no dia 10 de Janeiro de 1975, o filho do antigo internacional argentino Francisco Cecílio Velázquez entre os anos de 1966 e 1974 calça os patins pela primeira vez no Club Atlético Social de San Juan, aos quatro anos de idade, como guarda-redes, tal como o seu pai. Ao mesmo tempo praticava aquele que desde sempre foi o seu desportivo favorito, o futebol. Assim, jogava aos Sábados pelas camadas jovens do Social e aos Domingos pelo clube de futebol de San Martín. Destacava-se em ambos, ou não fosse Panchito um habilidoso em qualquer desporto, destacando-se mais tarde no automobilismo, ainda que como amador. Aos 16 anos estreia-se na formação sénior do Social San Juan, estávamos em 1991.



1991-1998, dividido entre o hóquei argentino e europeu
A sua técnica individual não passou despercebida ao Follonica, clube italiano que desde cedo percebeu de que ali se encontrava um génio, um atleta capaz de resolver encontros por si só. Parte em 1992 para Itália onde actua uma temporada, regressando no verão a San Juan para actuar no Estudiantil e no Social San Juan. É convocado pela primeira vez para a selecção nacional sénior argentina que se ficou pelo terceiro posto no Mundial 1993 realizado em Itália, país onde acaba por regressar para actuar novamente pelo Follonica. É no país transalpino que se denotam pela primeira vez as dificuldades psicológicas do atleta em ficar longe do seu meio ambiente. Não é feliz nas duas temporadas que fez em Itália e acaba por regressar definitivamente ao Social San Juan em 1994.



Entre 1995 e 1998 Panchito Velázquez está imparável. Após a experiência menos boa em Itália volta ao seu clube de origem e participa no Mundial de 1995 no Recife, onde se sagra campeão do Mundo e vence surpreendentemente o prémio de melhor jogador do torneio, demonstrando toda a sua qualidade. No ano seguinte, jogando pelo Social San Juan, é vice-campeão argentino, levando verdadeiramente a equipa às costas. Em 1997 regressa à Europa, desta vez para alinhar no campeonato espanhol, pelo Voltregà.

 



Na Catalunha, Panchito não desilude e dá o salto. O Barcelona contrata o jovem prodígio de San Juan que ainda antes de se estrear pelos blaugrana sagra-se vice-campeão do Mundo em Wuppertal, onde teve novamente um papel preponderante na formação albiceleste. A temporada 97-98 foi de sonho para o internacional argentino, como o próprio descreve: ‘’na temporada 97-98 joguei realmente muito bem’’, actuando ao lado do melhor companheiro (Gaby Cairo) e do melhor guarda-redes (Carles Folguera) com quem já actuou, segundo o próprio Panchito. O Barça sucede o Igualada como campeão espanhol e chega a um acordo com Panchito até 2009, com uma cláusula de rescisão de 25 milhões de pesetas, pouco mais de 150 mil euros.


No início da temporada seguinte tudo se modificou. A mentalidade catalã e a mentalidade do argentino colidiram, sendo incompatível a permanência de Panchito. ‘’Comecei a ter alguns problemas com alguns dirigentes e onde não sou feliz, não jogo. Ninguém me obriga. Os catalães são boa gente, mas não consentem pessoas que tenham sucesso sem esforço. A mim, se me matas com treinos estás a piorar. A toda a hora me diziam, repara, esteve cá um rapaz chamado Maradona que não se adaptou e deixámo-lo’’, adiantou o argentino alguns anos depois da sua estada em Barcelona.

De facto, é em Barcelona que se começa realmente a entender quem é Panchito enquanto jogador, dado que pela primeira vez se viu obrigado a obedecer a um conjunto de regras que nele não se evidenciavam. ‘’Panchito tem uma personalidade difícil e pouca vontade de trabalhar’’, afirmaram os dirigentes do Barça. "Panchito é um pouco imaturo, não tem objectivos pré-definidos. Quando foi para Espanha, era muito jovem e sentiu muito a falta da família e dos amigos’’ disse Ricardo Rodriguez, jornalista argentino. O próprio Panchito admite que treinar não lhe faz bem: ‘’se me matas a treinar, não rendo o mesmo. Houve gente que me criticou muito por isto mas é a minha forma de ser. Distinta, errada, boa ou má, não sei, mas é a minha’’.

1999-2000, do céu ao inferno
Apesar do vantajoso contrato que assinara com o Barça, teimou em regressar a San Juan para jogar no Social. Contudo nem em San Juan a vida lhe sorriu, tendo sido impedido de jogar no campeonato argentino. Impedido de jogar, Panchito deixa o hóquei e dedica-se ao futebol, desabafando mais tarde sobre o assunto: ‘’Estava um pouco cansado de tudo. O hóquei tem uma dimensão pequena, economicamente não gera balúrdios e os dissabores superam as alegrias. Deixei Espanha porque não geri o dinheiro e quando cheguei à Argentina queria jogar na Liga, mas não me deixaram porque tinha de me inscrever antes e o passe também não tinha chegado. Como não podia jogar, deixei o hóquei’’.



Panchito regressa ao seu desporto favorito, futebol, pelo San Martín, onde já havia jogado até aos 14 e depois aos 19 anos, sendo inclusive campeão regional na sua última passagem pelo clube de futebol sanjuanino. Apesar de habilidoso e inteligente, a sua estatura não ajudava. Em Fevereiro de 1999 o azar bate à porta de Panchito. Ainda a jogar futebol no Nacional B da Argentina pelo San Martín, sofre uma ruptura nos ligamentos cruzados do joelho esquerdo que o obrigou a parar durante oito meses. Após uma operação mal sucedida, Panchito regressa ao hóquei após o aconselhamento dos médicos que lhe disseram que era fisicamente impossível continuar a jogar futebol, pois a lesão continuaria a agravar-se, ao contrário do hóquei em que não teria de esforçar tanto o joelho. Actua no Estudiantil e novamente no Social San Juan até ao final do ano de 1999, chegando no início de 2000 o regresso à Europa.

2000-2003, relançar a carreira

Corria a época 1999-2000 quando Carlos Dantas, treinador do Benfica, adquire Panchito e o irmão Mariano. Na altura jogavam ambos no Social San Juan, o primeiro emprestado pelo Barça. O técnico português defendeu a aquisição dos argentinos com a necessidade que a sua equipa tinha de ganhar dinâmica, qualidade e imprevisibilidade no ataque, numa altura em que os encarnados atravessavam um mau momento ao nível dos resultados. Panchito era claramente a prioridade, dado que o irmão Mariano era completamente desconhecido no hóquei europeu. O irmão mais velho, Panchito, rotulou a sua relação com o irmão de muito boa. ‘’Somos muito unidos’’, afirmou. Antes de vir para Portugal, o jornal Record perguntou ao jornalista Ricardo Rodríguez se não aconteceria em Lisboa o que aconteceu em Barcelona: ‘’se poderá acontecer o mesmo no Benfica? Julgo que não. O Panchito já amadureceu, passou sete meses sem pegar num stick e, da última vez que falei com ele, garantiu-me que está decidido a aproveitar da melhor forma a sua vida desportiva". O próprio Carlos Dantas tinha algumas reticências quanto ao seu comportamento fora dos rinques. ‘’Eu não sei como é o seu comportamento social, mas sei que o seu comportamento desportivo é genial. É preciso dar-lhe liberdade porque com as qualidades que ele tem se houver algum treinador que lhe corte a liberdade então está-se a matar um pouco o génio e eu tenho de lhe dar liberdade porque efectivamente esta equipa precisa de criatividade’’, adiantou o técnico aquando da aquisição de Panchito. O principal objectivo do argentino eram os títulos, que no Benfica acabaram por ser escassos.

Começa mal a sua passagem pelo Benfica, contraindo novamente uma lesão logo nos primeiros meses de 2000, desta vez no menisco do joelho direito. Voltou a ser operado e em Maio do mesmo ano volta completamente recuperado. ‘’Quem me salvou foram os médicos do Benfica e o meu primo Hernán Ramírez, com quem fiz a recuperação’’, afirmou.



Com poucas partidas disputadas na época 99-00, acaba por ficar em terceiro lugar no campeonato português. No ano seguinte Panchito abre o livro, faz uma época de sonho onde apenas faltaram os ambicionados títulos. Vence a Taça de Portugal, é vice-campeão português e fica-se pelas meias-finais na Liga dos Campeões, eliminado pelo Liceo da Corunha na final a quatro realizada em Sevilha. O Benfica não tem dúvidas, Panchito tem de se desvincular do Barcelona. Os lisboetas partem para a final a quatro de Sevilha decididos em vencê-la mas, ao mesmo tempo, adquirir os direitos desportivos do argentino. O Barcelona é peremptório, Panchito só é do Benfica se o clube português pagar os pouco mais de 150 mil euros, na altura 25 milhões de pesetas. Seara Cardoso, vice-presidente do Benfica, desloca-se a Sevilha para tratar do assunto: "o presidente Manuel Vilarinho, assim como o responsável pelas modalidades, José Santos, não podem estar aqui, mas eu estou mandatado para tentar resolver o assunto. Tal como já anunciámos, estamos dispostos a pagar os 25 milhões de pesetas (cerca de 150 mil euros) que o Barcelona reclama. Trata-se de uma verba elevada para a modalidade, mas sabemos que estamos perante um investimento com retorno assegurado. Desportiva e socialmente, o Panchito é um atleta que muito interessa ao Benfica, pelo que vamos tentar chegar a acordo com os dirigentes do Barcelona’’. Mas o Benfica não é o único na corrida. O Real Madrid, representado no Hóquei em Patins pelo Alcobendas também estava interessado em Panchito. O Benfica e Panchito estão em uníssono, o jogador que ficar na Luz. A situação acaba por não ser resolvida em Sevilha pois, segundo os catalães, não é adequado tratar de negócios durante uma competição tão importante para os dois clubes. Carlos Dantas fica apreensivo quanto à permanência de Panchito, devido ao interesse do Real. "Provavelmente, eles preferem que o Panchito vá para o Real Madrid, porque precisam de rivalidade interna na modalidade. Se calhar, até o dispensam de borla", referiu o técnico. Panchito acaba por ficar no Benfica, assinando contrato até 2006, naquela que foi a transferência mais cara do Hóquei em Patins até hoje.



A temporada 01-02 começa com o Mundial 2001 realizado em San Juan. O jogador está no auge da sua carreira desportiva mas apesar disso, admite que joga hóquei por mera necessidade económica. ‘’Tenho que ganhar dinheiro para o futuro. Se não fosse assim, provavelmente hoje estaria a fazer outra coisa ou, pelo menos, a jogar no meu país e não na Europa’’. Diz também que não tenciona voltar ao Barcelona. No Mundial em San Juan, tenta o tudo por tudo para conquistar novo título mundial. Mesmo sendo considerado o melhor jogador do Mundial, acaba por ser novamente vice-campeão, uma constante na carreira que acabaria por acontecer de novo na Luz. Vence a Supertaça e a Taça de Portugal mas cai de novo nas meias-finais da Liga dos Campeões, desta vez em Guimarães frente ao Barcelona. No final deste jogo é visível a sua fraca condição física, acabando o argentino por sair em ombros perto do final do prolongamento pois já não se conseguia mexer mais. Era notória a dependência do Benfica do argentino, o que acabou por lhe provocar muitas moléstias e uma nova lesão no joelho esquerdo na recta final da temporada, frente à Oliveirense. ‘’Quando era a valer, com a Liga dos Campeões e decisões do campeonato, o nosso físico não estava no melhor. Não dava para mais. Eu tinha lesões, mas continuava a jogar. Um dia, o médico António Martins olhou para o meu joelho e perguntou-me: Como fazes para jogar? Cheguei a jogar com os dedos partidos, com uma placa a segurá-los... Quando chegava aos jogos decisivos, perdia muita massa muscular e recordo-me que havia 9 centímetros de diferença entre um joelho e o outro em termos de musculação. Era sempre a jogar e apenas com quatro jogadores de qualidade não dava para mais’’, afirmou Panchito anos mais tarde, justificando a falta de títulos pelo Benfica. O argentino acabou mesmo por fazer a pré-temporada com a equipa de futebol, para fortalecer os músculos. "O Pancho tem tido problemas nos dois joelhos e precisa voltar a ganhar força nas pernas. A ideia de treinar com uma equipa de futebol não é nova (quando se lesionou no ano passado esteve a treinar com os juniores), pelo que ele quer voltar a fazer o mesmo", afirmou na altura Carlos Dantas ao jornal Record.



A temporada 02-03 começa da melhor maneira, com a conquista da Supertaça António Livramento. Contudo, aquela que poderia ser a época de ouro acabou por ser o fim da linha de uma geração que marcou o hóquei encarnado. Panchito lesiona-se novamente e quando regressa frente ao Barcelona para a Liga dos Campeões já não é o mesmo. Fica evidente para todos que o argentino já não está em forma, já não é influente, levando mesmo o público a assobiá-lo pela insistência nas jogadas individuais sem sucesso. A própria relação com o irmão já não era a melhor. O Benfica é afastado da Liga dos Campeões logo na fase de grupos pelo Prato e pelo Barça, terminando o campeonato na terceira posição, ainda que a muitos pontos do campeão FC Porto. Foi uma época de intensa preocupação, pois o então Presidente do clube, Manuel Vilarinho, ameaçara terminar com a modalidade, fazendo com que existisse um impasse nos jogadores encarnados que não hesitaram e acabaram por sair do clube no final da temporada, apesar da modalidade se ter mantido.



2004-2006, aos tombos por Espanha e Argentina

Panchito sai do Benfica em 2003, voltando à Argentina, ficando inactivo para a modalidade. No final da época 03-04 o Voltregà volta a contratá-lo para a fase final do campeonato espanhol. Também aqui Panchito avisou, ‘’disse-nos que não lhe convém treinar muito’’, afirmou um dirigente do clube. Voltou a fazer a diferença nas últimas sete jornadas, ajudando o clube a manter-se no campeonato principal. A 11 de Maço de 2004 faz o primeiro jogo frente ao Tordera, entrando para fazer duas assistências e um golo, na vitória por 1-4. Acabou por fazer dois golos em sete jogos.


Regressa de novo à Argentina onde pára de jogar, comprando uma quinta agrícola na província de San Juan denominada de Las Marys. "O Panchito sempre gostou muito do trabalho do campo’’, afirma o irmão Mariano. No início de 2005, o técnico Mingo Quinteros convence-o a regressar ao Social San Juan. Estreia-se frente à UVT a 20 de Março onde marcou e assistiu, como habitualmente acontecia. Chega mesmo a ser convocado de novo para a selecção argentina comandada por Pablo Cairo, para disputar em San Jose (Estados Unidos) aquele que viria a ser o seu último Campeonato do Mundo. Joga dois anos depois ao lado do irmão Mariano pela albiceleste, onde acaba por perder na final frente à Espanha, por 2-1. Panchito acabou a sua carreira na selecção argentina com cinco mundiais disputados e 33 golos marcados, sendo actualmente o 14º melhor marcador de sempre da turma das pampas.

 



Após o Mundial volta a ser contratado pelo Voltregà mas a sua última aventura na Europa não duraria mais de um mês. Panchito vem para Espanha em Novembro e no fim do mês de Dezembro regressa à Argentina com zero golos marcados e supostamente de férias, mas acabou por não regressar. Tudo indicava que a carreira do astro argentino tinha terminado.

2010-2011, a última aventura


Em 2010 Panchito termina da melhor maneira a sua carreira desportiva, formando em San Juan uma equipa para disputar as competições da época 2010. O Sindicato de Empleados del Comercio, ou SEC, estreou-se em competições sénior pela primeira vez pela mão de Panchito que diariamente leva o seu filho Francisco ao Hóquei em Patins do clube. ‘’Senti que era uma forma de devolver ao hóquei tudo aquilo que ele me deu. Regresso porque estou entusiasmado, com vontade, com cabeça que é fundamental, porque os meus colegas me deram vontade de voltar e porque quero que os meus filhos (Francisco com 10 anos e Nazarena com oito actualmente) me vejam jogar, mas no final do ano retiro-me’’, afirmou Panchito na altura do seu regresso.


Tudo começou porque o treinador da equipa onde actua o filho de Panchito demitiu-se, ficando o astro como treinador da equipa depois dos pedidos efectuados pelos pequenos jogadores. Mais tarde, surgiu a ideia de criar uma equipa sénior por intermédio do próprio Panchito, em conjunto com Ramiro Carrión, Carlos Herrero e Francisco Díaz, todos eles pais de miúdos que jogam nas camadas jovens do SEC. Conseguiram juntar um leque de jogadores de grande qualidade, entre eles: Matías Pascual, Juan Soria, Chula Marimont, Jorge Bustos, Federico Carrión e, mais tarde, Mariano Velázquez. Mingo Quinteros era o treinador.



Assim, após quatro anos e meio sem calçar os patins, eis que Panchito regressa no dia 19 de Fevereiro de 2010, na primeira jornada do Torneo Apertura de San Juan. ‘’Desde o Mundial 2005 que não voltei a jogar nem a treinar. Não consigo jogar uma partida inteira. É certo que jogarei de maneira diferente, ficando mais atrás, mas jogarei até que o físico me deixe’’, adiantou Panchito. Jornada após jornada enche todos os rinques por onde passa, as vitórias surgem e o sonho do título tornou-se possível, seis meses depois da criação da equipa. ‘’É um sonho. Podes planificar, pôr objectivos, contar com o sacrifício dos jogadores, ter o apoio da direcção e tudo mais, mas jamais podia imaginar que em tão pouco tempo chegaria uma alegria como esta. Ganhar o título é espectacular. Muitas coisas sobre hóquei me vêm à cabeça quando apoio a cabeça na almofada, mas agora parece que estou a sonhar acordado’’, afirmou Panchito após a conquista do Torneo de Apertura de San Juan. Para Panchito, a boa figura no Torneo de Apertura deveu-se à óptima gestão física que teve. ‘’Eu só entrava 15 minutos do jogo ter começado, quando os adversários já sentiam o esforço. Mingo (Quinteros, treinador) esteve muito bem e nunca vacilou na gestão da minha pessoa e o Pablito (Saavedra, preparador físico) é um grande motivador. Se continuo? Não sei. Agora tenho de ver o joelho. Se tiver de ser operado novamente (pela quinta vez) deixo de jogar. Creio que já cumpri com a minha tarefa’’, finalizou no dia do título, aos 35 anos.

"Gosto de fazer fintas e rodriguinhos, mas em partidas equilibradas, não quando estamos a golear".



Apesar de ser um dependente da vida sanjuanina, Panchito nunca esquece o ‘’seu’’ Benfica. Nas várias entrevistas que teve oportunidade de dar aos jornalistas portugueses, é com grande ternura que recorda os anos passados na Luz. ‘’O Benfica foi o único clube na Europa de que fiquei adepto. Vestia a camisola e arrepiava-me, sentia pele de galinha. No Benfica podiam deixar de pagar durante muito tempo que eu jogava à mesma. O apoio que tínhamos era impressionante. Acabavam os jogos e ficava uma hora a dar autógrafos e a tirar fotos. Fazia-o com toda a alegria. Muitas vezes joguei lesionado, por gratidão aos adeptos respeito aos meus colegas e muitas vezes pelo meu treinador na época, o senhor Carlos Dantas. Uma pessoa que adorava e ainda adoro, sabia tudo de hóquei em patins, é único! Cheguei a jogar com os dedos partidos, não pensava muito em mim, queria era agradar a todos, mas nem sempre isso é uma boa opção. Sempre quis ganhar tudo no Benfica, mas na verdade a desilusão não foi assim tão grande, pois o valor da nossa equipa relativamente aos nossos rivais era inferior. Gostava de ter terminado a carreira lá e também gostava que um dia o meu filho jogasse lá com a camisola número sete’’, revelou ao jornal Record. ‘’Às vezes estava muito mal fisicamente, chegava ao pavilhão e tudo mudava. Estava sempre cheio, em todos os sítios. Seja em França, na Alemanha ou na Suíça, estava sempre alguém do Benfica. Era algo lindo, um laço muito grande. Vestia a camisola, transformava-me e deixava a pele em campo. Primeiro de tudo, adorei viver em Portugal, estive sempre muito bem e fui muito feliz. Recordo-me que saía de casa, apanhava a Avenida Marginal e era um prazer enorme passar por ali. Comprei a minha primeira casa em Lisboa e foi uma satisfação viver lá. Eu e o meu pai fazíamos sempre grelhados, estávamos realmente muito bem em Lisboa. Nessa altura também nasceu o meu filho e ele agora diz mesmo que é português’’, avançou ao jornal português em 2011.

O argentino também recorda os embates com o FC Porto e falou também do hóquei português, ‘’eram sempre os jogos do ano, muito lindo, eram jogos muito competitivos. Dava tudo para os ganhar! Jogos muito intensos onde os adeptos vibram imenso, uma rivalidade tremenda, e nesses jogos dava-mos tudo para vencer, sabíamos a importância que isso tinha para os adeptos. Nunca me esquecerei de um que marquei na Luz contra o FC Porto… Passei pelo meio da equipa deles e fintei o Edo Bosch, marcando um golo que levantou o pavilhão’’. ‘’Imaginava o hóquei português muito atractivo, mas não tanto, as equipas eram muito profissionais. As pessoas adoravam o hóquei em Portugal. Ainda hoje acho que o hóquei português é um dos mais bonitos para se jogar. Uma honra enorme, mas como em tudo, nada dura para sempre. Apenas dura aquilo que transportamos na alma, nas nossas recordações e essas são imensas e guardo-as todas no meu coração. Estou muito orgulhoso da minha carreira’’, disse ao jornal Record em 2011.

Terminou da melhor maneira a carreira do jogador mais irreverente dos hóquei moderno e, provavelmente, o mais inesquecível, o que mais se igualou ao seu grande ídolo, António Livramento. Com altos e baixos, lesões atrás de lesões (principalmente em 1999, o pior momento da carreira para Panchito), ficou a sensação que algo mais poderia ter sido feito, de que a sua qualidade não foi justificada pelos títulos e que o seu gosto pelo hóquei nunca chegou a ser apaixonante. Talvez tenha sido esta última a grande diferença em relação a Livramento. Para já, Panchito não pensa em ser treinador, estando apenas a ajudar nas camadas jovens do SEC e trabalhando na sua quinta em San Juan.

‘’Que me vai passar pela cabeça quando me retirar? Não sei, antes disso quero comer. Mas seguramente que vou dizer a mim mesmo que sou um idiota porque não fiz muitas coisas que poderia ter feito’’.


CARREIRA
1991 – CA Social San Juan
1992/1993 – AP Follonica Hockey (Itália)
1993 – DU Estudiantil e CA Social San Juan
1993 – Campeonato do Mundo em Itália (3º lugar)
1993/1994 – AP Follonica Hockey (Itália)
1994 – CA Social San Juan
1995 – CA Social San Juan
1995 – Campeonato do Mundo no Brasil (Campeão)
1996 – CA Social San Juan
1996/1997 – CP Voltregà (Catalunha)
1997 – Campeonato do Mundo na Alemanha (Vice-campeão)
1997/1998 – FC Barcelona (Catalunha)
1999 – DU Estudiantil e Concepción PC
1999/2000 – SL Benfica (Portugal)
2000/2001 – SL Benfica (Portugal)
2001 – Campeonato do Mundo na Argentina (Vice-campeão)
2001/2002 – SL Benfica (Portugal)
2002/2003 – SL Benfica (Portugal)
2003/2004 – CP Voltregà (Catalunha)
2005 – CA Social San Juan
2005 – Campeonato do Mundo nos Estados Unidos (Vice-campeão)
2005/2006 – CP Voltregà (Catalunha)
2010 – Sindicato EC
2010 – CD 1º de Agosto (Angola)
2011 – Sindicato EC

TÍTULOS:
1 Campeonato do Mundo (1995) Argentina
1 OK Liga (1997/1998) FC Barcelona
2 Taças de Portugal (2001 e 2002) SL Benfica
2 Supertaças António Livramento (2002 e 2003) SL Benfica
1 Torneo de Apertura de San Juan (2010) Sindicato EC