ESTRANHA FORMA DE VIDA - CAPÍTULO 3
Capítulo 3 - VOU DAR DE BEBER À DOR
Poder-se-ão apelidar os anos de 2005 a 2009 de ‘anos de prata’ das plataformas da modalidade, mas será importante lembrar que elas existem por puro pecado não só da Federação, mas também dos órgãos de comunicação profissionais. Foram eles os responsáveis pela criação das plataformas, que só por si começavam a ser pequenas para ‘alimentar’ os amantes da modalidade, tendo em conta que também a televisão começava a dar de si. Como foi referido em capítulo anterior, a RTP faz a sua última época regular em transmissões televisivas em 2003/2004, pertencendo à Sport TV a semelhante responsabilidade na época seguinte. Em 2006/2007 e 2007/2008 apenas as competições europeias e alguns jogos do playoff passavam na RTP, canal que desde então até aos dias de hoje se tem dedicado apenas às competições internacionais de clubes e selecções. Assim, entre 2008 e 2009, nenhum jogo do campeonato nacional foi transmitido em qualquer televisão, cabendo à Benfica TV o regresso às transmissões televisivas da maior prova do hóquei nacional nesse ano. Não é esta escassez que alimenta directamente as transformações que vamos apresentar, nas plataformas não oficiais da modalidade, até porque as TV’s online nunca transmitiram jogos dos candidatos ao título, até porque esses começaram a ter os seus meios próprios para a transmissão dos jogos da sua equipa, com a Benfica TV em 2009 e o Porto Canal em 2011. Por outro lado, não é menos verdade que a escassez de coberturas televisivas entre 2008 e 2009 permitiu outro tipo de visibilidade às TV’s ‘online’, nomeadamente no número de visualizações dos encontros.
E, mais uma vez, as transmissões ‘online’ surgiram de um velho sonho na Ilha de São Miguel. “Fui pioneiro na transmissão de jogos online, lembro-me que foi num jogo do Santa Clara que fiz a primeira cobertura. Primeiro com 120k e, mais tarde, em 500k no Livestream. Como era treinador da União Micaelense e administrava o sítio, deixei ao Brunim a continuação dessa tarefa, ainda que continuasse a ajudar, nomeadamente no material e na ajuda à utilização do mesmo”, explica Pedro Jorge Cabral, que acabaria por ajudar ao aparecimento de outras tv’s ‘online’, esclarecendo os interessados quanto aos procedimentos de iniciação. Um desses exemplos é a Parede TV, administrada por Luís Gomes, o mesmo que acabaria por ser responsável pelo aparecimento, em 2010, da PA TV. “Já tinha algumas luzes e como sou desginer gráfico, tudo ficou mais fácil. No entanto, foi um início demorado, cheio de testes e criações de bases para iniciar a tv ‘online’”, lembra o administrador Luís Gomes, antigo jogador de hóquei que se viu obrigado a parar após lesão. Uns anos depois iniciou o seu apoio à iniciação do Parede FC, começando por essa altura a transmitir os encontros da equipa sénior do clube. “Teve uma grande repercussão e ajudou imenso à vinda de mais miúdos para a iniciação. Lembro-me de perguntar a muitos porque queriam vir para o hóquei e diziam-me que tinham visto na internet com os pais. Deu um dinamismo muito grande ao clube”, afirma. A Turquel TV iniciava também, por volta de 2005, as primeiras coberturas.
A REVOLUÇÃO TECNOLÓGICA
A partir de 2008, inicia-se um rápido processo de transformação da maior plataforma não oficial de hóquei em patins. “Descobri uma forma de enviar informação directamente para o sítio, sem ter de utilizar a folha de excel. Esta novidade acabou por me poupar imenso tempo e permitir abrir o sítio a outros campeonatos e a mais tipos de informação. Comecei por colocar tudo numa ‘dropbox’, transformando totalmente a minha forma de trabalhar”, explica Pedro Jorge. Assim, já no decorrer da época 2007/2008, começaram a surgir os resultados ao intervalo e com os marcadores dos golos, passando no ano seguinte os resultados dos campeonatos espanhol e italiano. “A própria organização do sítio estava diferente. Enquanto numa fase inicial se resumia apenas a uma página com todos os resultados, desde setembro a fevereiro por exemplo, em 2008/2009 comecei a organizar as competições por cores e a colocar as competições de uma forma mais organizada, dividindo também os jogos por meses”, explica o administrador. Um ano depois surgiram também as listas de melhores marcadores e os primeiros apoios financeiros, neste caso pela marca de ‘sticks’, Azemad. “A partir de 2009/2010 dá-se uma nova transição gráfica no sítio e novas informações, como a ‘classificação verde’, o quadro de jogos de cada competição e as informações sobre o campeonato suíço e alemão. Também comecei a colocar uma agenda e os árbitros. Este ano (2014) já coloco os árbitros do campeonato espanhol, inclusive, e tenciono para a próxima época começar a publicar os resultados do campeonato inglês. Tudo está muito facilitado na medida em que o programa está de tal forma avançado que me facilita imenso a colocação de informação. Estou com 15 a 20 competições e consigo fazer tudo com um simples ‘enter’. Em dois minutos, tudo fica pronto na hora”, diz Pedro Jorge. Em termos de ‘chat’, o administrador também fez progressos no sítio, comprando um sistema de personalização dos indivíduos que faziam os comentários, dando-lhes a responsabilidade que em ‘anonimato’ não tinham. “O ‘chat’ foi uma das maiores mudanças do hóquei em patins. Aproximava os adeptos. Sempre foi a minha paixão maior. No entanto, estava muito desorganizado. Hoje há mais respeito entre as pessoas e só beneficiou as discussões que por lá proliferam”, revela o açoriano.
Em paralelo, Fernando Castro cria um outro blogue, apelidado de rink-hockey-news.blogspot.pt, direcionado para informar os amantes da modalidade sobre os títulos conquistados no maior número de competições nacionais e internacionais. “Apresenta, de forma resumida, algumas informações, com ênfase particular nas competições menos divulgadas, como é o caso de países ou regiões onde a modalidade está menos desenvolvida”, avança o administrador. Já o Mundo do Hóquei tornava-se totalmente inovador em dois aspectos. O primeiro, a presença ‘in loco’ dos seus responsáveis numa grande competição, neste caso o Campeonato do Mundo de 2009 realizado em Vigo. Em segundo lugar, a promoção da modalidade através de iniciativas que envolvessem o próprio jogo, como a criação de um jogo ‘All-Star’ ou a própria criação de um campeonato nacional feminino composto por atletas mais jovens, ‘obrigando’ a Federação a organizar um campeonato nacional feminino de Sub-19. Nesse ano, Nélson Alves acaba por administrar o sítio sozinho. “O nosso trabalho era reconhecido por pessoas de todo o mundo, desde Portugal a Moçambique e ao Brasil, passando por Espanha, Estados Unidos, França e mesmo Austrália. Mas um avolumar de prejuízos financeiros, de ideias falhadas e de divergências quanto ao papel dos elementos que faziam parte do projeto, fez com que eu decidisse seguir um caminho sozinho. Percorri o país à procura de patrocínios, dei a cara por aquilo em que acreditava, consegui alguns apoios, mas o facto de estar só com todo o sítio fez com que ficasse demasiado cansativo, pois estava a prejudicar a minha vida pessoal e profissional”, explica Nélson que uma época depois acabaria por receber uma preciosa ajuda do irmão, Pedro Alves, enquanto fotógrafo. “Nem nas duas semanas de férias que eu costumava tirar em Agosto, as visitas diminuíam”, completa.
Em 2010, juntam-se ao panorama cibernético Tiago Silva e Gonçalo Gomes. O primeiro com a criação de um sítio informativo, onde se incluem diversas entrevistas. “O espaço surgiu de duas situações muito simples: paixão pela escrita desportiva e pela modalidade”, refere Tiago Silva. Quanto ao segundo, seguiu os passos da PA TV (fundada em 2008) e da Turquel TV para formar a Física TV. “A Física TV cobria os jogos da equipa sénior e fazia os resumos dos mesmos, por mera ‘carolice’ minha, sócio do clube, e sem qualquer apoio deste. O meu objectivo era, para além de querer ajudar a instituição, potencializar as receitas de publicidades no pavilhão e equipamentos, aumentando a valorização dos patrocinadores através da divulgação das imagens; motivar os jogadores e potenciais novos atletas para ingressar no clube, e consequentemente encher o pavilhão de sócios, adeptos e simpatizantes. A repercussão desta TV ‘online’ foi bastante positiva, principalmente, junto dos jogadores. Obtivemos também algumas reacções de todo o país e até mesmo do estrangeiro”, refere Gonçalo Gomes. Neste ano, é criada pela primeira vez na modalidade uma plataforma profissional de informação e transmissão de jogos, denominado de Plurisports, um sítio somente dedicado a desportos de patins, com a grande - quase total - fatia do espaço a pertencer ao hóquei. Este sítio acaba por acrescentar valor, não só ao nível de conteúdos programáticos com os intervenientes da modalidade mas também nas camadas jovens, onde as transmissões de jogos de escalões jovens era uma parte importante – e de sucesso – do sítio.
Em 2011 continuam a surgir novidades. As plataformas existentes não param o seu progresso, dando um pouco do seu espaço para a criação de outras. No que toca à evolução, trata-se do ano em que o hoqueipatins.pt se aproxima mais daquilo que hoje é, em termos de oferta informativa e grafismo, começando em 2010/2011 com os ‘jogos e classificações na hora’ e, uma época depois, organizando as partidas semanalmente, facilitando e muito a vida aos visitantes do sítio. Também ao nível das transmissões ‘online’ houve uma clara modernização, como explica Luís Gomes, da PA TV. “De início trabalhava com apenas uma câmara, depois de 2010 já tinha quatro a cinco para um só jogo. O software da edição do vídeo passou a ser feito directamente na internet, permitindo colocar grafismo nos jogos devido à celeridade que permitia. Hoje consigo pôr um emblema e tudo isso se deve às melhorias da internet. O próprio facto de existir internet sem fio, algo que no início das minhas transmissões não existia, transformou por completo a forma de trabalhar”. Luís Gomes tornou-se no primeiro administrador de TV’s de hóquei ‘online’ a deixar o livestream, fazendo as suas transmissões via youtube, melhorando e muito a qualidade da imagem. “Fui também pioneiro em criar um canal de hóquei em patins na MEO, com o canal PA TV”, completa. Ao nível de apoios conseguiu ajuda do CD Paço de Arcos que lhe pagava um subsídio por cada jogo transmitido, e da Vodafone que lhe ofereceu a internet móvel, ainda assim, acha insuficiente tendo em conta o trabalho realizado. “Estava muito só. Na época passada ainda tinha o José Carlos Gaspar para me ajudar, caso contrário seria eu e o meu filho a fazermos as transmissões. Torna-se cansativo”, afirma.
Do lado regional, Francisco Gavancho deixou de estar só, surgindo mais a norte o Hóquei Minhoto, da autoria de Miguel Bastos. “No final da época 2010/2011 fui confrontado com a decisão de uma rádio de Barcelos (onde fazia os relatos do OC Barcelos) não continuar a divulgar a modalidade. Uma decisão influenciada por contornos políticos, continuando-se infelizmente a relacionar o desporto com a política. Após vários convites de outras estações emissoras decidi criar o Hóquei Minhoto com a intenção de divulgar a modalidade em especial na região do Minho que como se sabe é uma das maiores regiões do país onde se pratica o hóquei em patins”, explica o administrador. De início, o blogue abrangeu apenas OC Barcelos, HC Braga e Juventude de Viana, os clubes mais conceituados da região. Mais tarde foi alargado o leque para clubes que militavam em escalões inferiores, casos de Famalicense, Riba d’Ave, Ancorense, Fão, CAR Taipense e Valença. “A visibilidade desses clubes e da modalidade foi um enorme sucesso não só na região, mas também no resto do país e além-fronteiras, especialmente nas comunidades portuguesas onde jogam muitos atletas nascidos na região. As pessoas começaram a entender que, afinal, até havia muito Minho para se falar”. À imagem do Mundo do Hóquei no final da primeira década do milénio, também é hábito do Hóquei Minhoto acompanhar ‘in loco’ às grandes competições. “Já marquei presença em finais a quatro de Taças de Portugal, Liga Europeia de Clubes, Inter-regiões, Mundial de Sub-20 que se realizou em Barcelos e em diversas finais a quatro dos nacionais das camadas jovens”, lembra. Tudo isto, “em prol da modalidade e com a intenção de informar, não só os cibernautas mas também de ‘abastecer’ certos órgãos de comunicação social nacional.
Já em 2012, outro projecto de TV ‘online’ é criado. Chama-se TV Hóquei HD, de Diogo Nunes, e que conta com alguns projectos futuros de elevado interesse para a modalidade. Até pela data em que foi criado (bem mais tarde que as restantes), o seu administrador foi o único da minha peça a admitir que a existência das TV’s ‘online’ foram uma motivação para criar este projecto, adicionando também a paixão que tem pela modalidade. Em 2012/2013 fez um blogue para colocar os vídeos dos jogos da AA Amadora - a qual fazia as coberturas - e na época seguinte já contava com um canal. Apesar da rápida evolução e do investimento realizado para o plano, não está satisfeito com a repercussão que o seu trabalho tem tido, nomeadamente no seu clube. “Há muitas pessoas do clube que ainda não sabem que o clube tem um canal no youtube”, diz. Começou por filmar com o telemóvel até que em Abril de 2014 comprou o material necessário para realizar uma filmagem em melhores condições. Não se demonstrando satisfeito com a pouca visibilidade, fez pela vida. “Comecei a enviar e-mails para as equipas que jogavam frente à AA Amadora para verem os jogos no canal, inclusive quando filmei um jogo importante do clube na Luz, só o pude fazer porque ficou acordado que, mais tarde, enviaria um DVD para o Benfica com o jogo. E assim o fiz”. Todo este trabalho de propagação resultou num aumento da média para o dobro das visualizações, contando já com alguns progressos ao nível de Facebook. “Conto já com cerca de 500 gostos na página oficial, quadruplicando a média de visualizações do canal no youtube”, realça.
Pela quantidade e qualidade, poder-se-á apelidar 2012 como o ano de ouro das plataformas independentes de hóquei. Nos ‘media’ em geral, se olhar para 2002, verá uma realidade nem pior nem melhor, mas diferente. Mais jogos na televisão através da Benfica TV, Porto Canal e A Bola TV, mas em canais com menos visibilidade que a RTP1 ou mesmo RTP2, como acontecia 10 anos antes. Assim se caminha para 2013 e 2014, anos esses que acabam por nos reservar algumas surpresas negativas, mas porventura necessárias.